1. Sempre Vivemos no Castelo, por Shirley Jackson – tradução de Débora Landsberg
176 páginas • título original: We Have Always Lived in the Castle • Alfaguara
Merricat, sua irmã Constance e o tio Julian são os sobreviventes de uma tragédia familiar que quase acabou com os Blackwood. Acusada (e depois inocentada) de ter envenenado a própria família, Merricat teme que a chegada do primo Charles abale a delicada e insólita rotina das irmãs. Eu gostei do clima misterioso que permeia toda a narrativa e de como a verdadeira história dos Blackwood vai sendo revelada aos poucos. A presença do primo desestrutura os pequenos rituais já estabelecidos pelas irmãs e traz um elemento de suspense numa trama já repleta de estranhezas. O casarão é um elemento chave, o castelo que esconde segredos, o refúgio onde o que restou da família se esconde e se protege do mundo exterior hostil e assustador. O livro foi adaptado para o cinema em 2018, com o nome Os Segredos do Castelo. Eu não assisti, mas li muitas críticas dizendo que a diretora, Stacie Passon, tirou o poder sombrio inerente às personagens femininas, optando por vitimizá-las, o que é definitivamente um problema, já que tira bastante da ambiguidade e da dúvida que sentimos a respeito da irmãs ao longo da leitura.
•
2. O Despertar de Tudo, por David Graeber e David Wengrow
tradução de Claudio Marcondes e Denise Bottmann
696 páginas • título original: The Dawn of Everything • Companhia das Letras
Uma leitura para mudar tudo o que você (e o resto do mundo) pensa que sabe sobre o surgimento da civilização: O Despertar de Tudo questiona de forma incisiva e espirituosa as grandes crenças intelectuais sobre o passado da humanidade. Os autores, um antropólogo e o outro arqueólogo, sustentam que sempre que tentamos adivinhar quais eram as atividades dos seres humanos em outros tempos e lugares, quase sempre nossos palpites são menos interessantes (e excêntricos) do que aquilo que provavelmente estava acontecendo. A clássica divisão rígida dos nossos ancestrais em duas categorias (os livres e inocentes de Jean-Jacques Rousseau versus os guerreiros e brutais de Thomas Hobbes) esconde um universo com possibilidades muito mais lúdicas e inesperadas do que poderíamos imaginar. Alguns dos temas tratados (e questionados) no livros são a origem da agricultura, da propriedade, das cidades, da escravidão ~ e um ponto que achei particularmente notável: a marginalização das mulheres e o apagamento histórico do protagonismo e liderança de figuras femininas. É um livro denso, que eu levei BASTANTE tempo para ler, mas que valeu super a pena e abriu a minha mente para teorias alternativas a respeito do passado.
♥
3. Outono, por Karl Ove Knausgård – tradução de Guilherme da Silva Braga
208 páginas • título original: Om høsten • Companhia das Letras
Primeiro volume da nova série do fenômeno Karl Ove Knausgård intitulada Quadrilogia das Estações, Outono é um livro breve em que o destaque é, mais uma vez, o seu olhar poético a respeito do absolutamente mundano. Karl Ove escreveu o livro para a filha ainda não nascida e explica em uma das cartas dirigidas a ela o motivo: segundo ele, as crianças vivem de forma tão intensa no mundo que não refletem sobre ele, não percebem o que as separa dele. Sendo assim, o autor apresenta o mundo à filha através de pequenos textos a respeito do mundo que vivemos como ele é agora: ele escreve sobre maçãs, dentes, sangue, galochas, piolhos, dor, Van Gogh, silêncio… os temas são aleatórios e nada é irrelevante demais para as suas observações. A narrativa é incrivelmente pessoal, permeada por lembranças de infância e particularidades a respeito da sua vida naquele momento, como pai e marido vivendo numa zona rural da Suécia. Claro, alguns textos/temas são mais inspirados que outros e vão gerar mais (ou menos) identificação e empatia dependendo do leitor, mas suas observações profundas, quase didáticas, sobre cada assunto são sempre muito interessantes.
•
4. A Intuição da Ilha, por Pilar del Río – tradução de Sérgio Machado Letria
288 páginas • título original: La intuición de la isla • Companhia das Letras
Se você procura um livro (de não-ficção) para te deixar com o coração leve e um sorriso na alma, não precisa mais procurar. Pilar del Río, jornalista e tradutora, casada com José Saramago desde 1986, conta com delicadeza absoluta sobre os dias do escritor na ilha de Lanzarote, localizada no arquipélago das Ilhas Canárias, para onde foram morar seis anos depois e onde Saramago viveu (e escreveu) até o fim da vida. Deslocado do seu país natal, onde vinha sofrendo censura pelo então presidente de Portugal Cavaco Silva, o escritor encontrou n’A Casa da ilha não apenas um refúgio, mas um lugar de encontros, conversas, amizades, solidariedade e muita alegria. Os episódios domésticos narrados por Pilar são tão plenos de ternura e afeto que é impossível não se emocionar, não desejar também uma vida repleta de sensibilidade, cooperação e grandeza. O bônus é que o leitor fica, inevitavelmente, com vontade de ler (ou reler, se for o caso) todos os livros que Saramago escreveu na ilha, uma vez que Pilar fala sobre o processo de criação de cada um deles. Um deleite.
♥
O que vocês andam lendo de bom por aí? Me contem nos comentários!
Confira outros títulos na Bibliolove – a biblioteca virtual do blog. :)