Era uma vez um rei mouro que se apaixonou por uma criada. Casaram-se e viveram felizes para sempre durante algum tempo.
Acontece que a rainha vinha de um país do Norte, onde o chão se cobre de neve, e não se parecia com ninguém no palácio ~ nem no reino inteiro. Ser estrangeiro não é fácil, até mesmo quando se é uma rainha. Sem amigos, família, sua língua natal, suas comidas preferidas… a rainha acabou adoecendo. Perdeu a vontade de fazer todas as coisas, suas costas e sua cabeça doíam, ela só queria descansar e esperar pelo dia seguinte. Mas a cada dia ela se sentia pior.
Um livro lindo, sensível e belissimamente ilustrado pela autora portuguesa Joana Estrela, A Rainha do Norte trata de um tema difícil, a depressão, de forma muito delicada e humana. O texto é curtinho, mas é impossível não se emocionar com a história da rainha estrangeira que aos poucos vai perdendo o seu brilho, deixa de sair de casa e até de abrir as janelas.
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Os melhores médicos e curandeiros do reino foram chamados para examinar a rainha e cada um tinha um diagnóstico diferente: histeria, uma virose que anda por aí, falta de exercício físico, muito exercício físico… Mas nada fazia efeito e a rainha se sentia cada vez mais cansada e triste.
Até que um dia apareceu no palácio um médico vindo de um reino distante, que ouviu falar da doença da rainha e decidiu visitá-la. Esse médico não mediu a pressão da rainha, não examinou seus ouvidos e garganta, nem ao menos auscultou o seu coração. Em vez de tudo isso, ele sentou-se para conversar com ela. <3
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O livro é inspirado numa lenda do Algarve conhecida como a Lenda das Amendoeiras em Flor. Diz a lenda que um rei mouro casou-se com uma princesa do norte da Europa, que vivia triste, com saudades das suas terras cobertas de neve. O rei então planta centenas de amendoeiras aos pés de sua janela para que, quando chegasse a primavera, as árvores estivessem carregadas de flores brancas e o chão coberto de pétalas, que lembrariam a princesa dos campos cobertos de neve da sua terra natal.
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A lenda por si só já é linda, mas a adaptação da Joana Estrela conseguiu deixar a história ainda mais tocante ao focar na importância do reconhecimento e do tratamento adequado da depressão. Tudo isso numa linguagem muito acessível e clara para o público infantil/juvenil. E tenho certeza que muitos adultos ficariam comovidos com o livro (como eu fiquei), que é ao mesmo tempo singelo e riquíssimo. Ganhou meu coração.
Felicidade em dobro é comemorar alguma data especial com um dos bolos personalizados da Wanderbakes. Imagina a alegria de celebrar com uma dessas lindezas (e a dó na hora de cortar)!
Delicadeza do dia: os traços finos e delicados da artista Ryn Frank. Suas inspirações: uma vida imersa na natureza, dias desenhando à beira-mar, colhendo flores e cuidando do jardim. ♥
1. Bolo Preto, por Charmaine Wilkerson – tradução de Karine Ribeiro 304 páginas • título original: Black Cake • Paralela
Byron e Benny são irmãos que, diante da morte da mãe, precisam deixar de lado suas diferenças e os ressentimentos que cultivaram um pelo outro ao longo dos anos. Reunidos novamente para ouvir uma gravação deixada por ela, os irmãos descobrem a verdadeira história da mãe e são confrontados com segredos que abalam tudo o que pensavam que sabiam sobre sua família e sobre si mesmos. O tal do bolo preto é a chave para desvendar a herança deixada pela matriarca, uma tradição que possuía muito mais significado do que os irmãos poderiam imaginar. A estrutura do livro é um novelão (no sentido depreciativo, infelizmente). Os irmãos demoram dias para ouvir a gravação deixada pela mãe, fazem pausas, saem da sala, deixam para o dia seguinte… Tudo isso como estratégia da autora para deixar tudo mais misterioso e adiar a revelação (claro!), mas QUEM faria isso na vida real? Os capítulos são curtíssimos, alguns com apenas uma, duas páginas. Pessoalmente, prefiro capítulos mais trabalhados, com menos pausas e quebras na estrutura narrativa. A história e a escrita da Charmaine Wilkerson não são particularmente ruins, mas a minha impressão no final do livro é que autora se dedicou exclusivamente a fechar TODAS as pontas soltas, a dar um final feliz e/ou adequado a CADA mínimo personagem ~ tipo fim de novela mesmo. Desnecessário. O livro foi best-seller do New York Times e vai ser adaptado para uma série, produzida pela Oprah Winfrey, além de ter virado queridinho de celebridades do naipe de Barack Obama, mas não me emocionou.
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2. As Convidadas, por Silvina Ocampo – tradução de Livia Deorsola 264 páginas • título original: Las invitadas • Companhia das Letras
São 44 contos bem curtinhos, mas nem por isso menos curiosos ou instigantes. Todos possuem elementos fantásticos (alguns mais do que outros), uma certa estranheza ou algum componente insólito. Como se Silvina olhasse para a realidade da vida cotidiana com lentes mágicas, surreais. As histórias que mais me marcaram foram: Carta debaixo da cama, em que uma mulher se vê sozinha, isolada numa casa de vidro sem cortinas, com notícias de um assassino rondando a região; O sinistro do Equador, em que um garçom morto num acidente trágico reaparece para servir a mesa de uma família em choque e O fantasma, em que um perfume inebriante passa a perseguir e a invadir todas as circunstâncias da vida de um homem.
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3. Heróis da Fronteira, por Dave Eggers – tradução de Rubens Figueiredo 416 páginas • título original: Heroes of the Frontier: A Novel • Companhia das Letras
Uma mulher viaja pelo Alasca, sem destino certo, com os dois filhos pequenos à bordo de um trailer velho ~ e nós, leitores, vamos descobrindo aos poucos do que ela está tentando escapar. Josie quer distância do ex-marido estúpido e irresponsável, que não dá a mínima para os filhos, mas que faz questão de apresentá-los para a família da atual noiva. Quer esquecer que acabou de perder seu consultório dentário, após um processo movido por uma ex-paciente diagnosticada com câncer de boca. É assombrada pela morte de um paciente adolescente no Afeganistão, depois que ela o encorajou a se juntar aos fuzileiros navais. Além disso, existe o seu conturbado histórico familiar: Josie foi emancipada depois que os pais enfermeiros se envolveram num escândalo de prescrição de drogas em um hospital, que resultou em 18 suicídios e uma série de overdoses acidentais. Deu para sentir o drama, né? Mas o livro é SUPER bem humorado (eu ri em voz alta em alguns momentos), é impossível não se contagiar com a energia caótica da personagem principal. Josie alterna entre uma certeza inabalável de que tudo vai dar certo e uma insegurança profunda a respeito de tudo. Oscila entre uma felicidade exultante (e a vontade incansável de seguir em frente) com uma impaciência e o cansaço com a vida na estrada. Mas o coração da história com certeza está no relacionamento de Josie com os filhos, no quanto as suas aventuras no Alasca acabam fortalecendo um vínculo já tão intenso. Para quem leu: impliquei bastante com o capítulo da “música histérica”, achei pouquíssimo crível (mesmo se tratando de uma obra de ficção permeada por situações/soluções pouco realistas) e, para mim, destoou do resto do romance. O que vocês acharam?
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4. Abandonar um Gato, por Haruki Murakami – tradução de Rita Kohl 112 páginas • título original: Neko o suteru • Alfaguara
Livro super curtinho (pequenos textos que dariam um belo artigo numa revista literária) onde Murakami relata suas lembranças do pai, da infância e juventude, já que passou mais de 20 anos sem vê-lo, só voltando a reencontrá-lo pouco antes da sua morte. O autor tenta esmiuçar o que sabe sobre a vida do pai através de pesquisas e da própria memória, especialmente as suas experiências no serviço militar e seus traumas de guerra. Diferente das demais obras do Murakami, o texto me pareceu bem mais descritivo do que lírico, com exceção das suas duas recordações que envolvem gatos (os textos que iniciam e encerram o livro), onde dá para sentir uma pitada do poético tão característico da sua narrativa. Em determinado momento ele mesmo admite que vai tocar no assunto (no caso, das suas desavenças com o pai) apenas superficialmente, sem entrar em detalhes, para que o texto não fique longo e visceral demais. Mas acho que senti falta justamente disso, de um relato mais íntimo e arrebatador, senti uma certa dificuldade de realmente compreender a relação entre os dois. As suas reflexões sobre a causalidade da vida são muito verdadeiras e inspiradoras e valem a leitura por si só. Essa edição da Alfaguara está muito simpática, com capa dura e ilustrações da Adriana Komura.
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Piscamos e o final do ano chegou: quem mais teve essa sensação em 2022? Encerro esse ano com o coração cheio de esperança e planos para o ano que vem. Como sempre, gostaria de agradecer a todos vocês que continuam visitando o Não Me Mande Flores, deixando mensagens e comentários sempre muito carinhosos. Vocês são demais!
Feliz Natal e um 2023 lindo para todos nós! \o/
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