Louise poderia ser uma menina como tantas outras, mas ela possui algo diferente: um enorme leão dourado, que mora em seu apartamento e a acompanha em todos os lugares. Ele lhe dá conforto, segurança, uma sensação de que nada ruim pode lhe acontecer.
Quando um caminhão de mudança estaciona na frente do seu prédio, Louise descobre que o seu novo vizinho é um caçador de grandes animais selvagens. E agora? O que será do seu amigo leão?
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Para nós, leitores adultos, fica claro desde o princípio que o leão é, na verdade, uma espécie de amigo imaginário que protege Louise dos seus medos ~ mas que também acaba afastando a menina de possibilidades reais de relacionamento e amizade. Ela está tão confortável com o seu leão, que acaba esquecendo o nome dos seus coleguinhas de classe e os chama simplesmente de ‘crianças’.
O tom do livro é quase triste. O início da história mostra um padrão de negligência e ausência por parte das pessoas que mais deveriam se importar com Louise: o professor, que “age como se ela não estivesse na sala, como se ela não existisse” e a mãe, que “sempre diz que precisa sair correndo para o trabalho ou para algum encontro” e deixa a comida na cozinha, coberta com papel-alumínio, com um bilhete dizendo que vai voltar tarde. De cortar o coração.
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Achei que a chegada do novo vizinho ~ que, é claro, não é um caçador e sim um menino que quer a amizade de Louise ~ pode ser um pouco confusa, especialmente para crianças pequenas. Louise, com sua imaginação fértil, “vê” caixas de armamento serem descarregadas e “ouve” um barulho constante das armas sendo carregadas. O medo que ela sente é tão grande que ela se tranca (com o leão) no armário, achando que o caçador vai “matá-lo e pendurar sua cabeça na parede“. A gente entende a analogia, mas o meu filho de 3 anos, por exemplo, teve um pouquinho mais de dificuldade de fazer essa interpretação mais solta, menos literal.
Dito isso, o livro é SUPER sensível e bonito. Lida sim com temas pesados como tristeza, isolamento e desemparo, mas o final é redentor e esperançoso. O leão desaparece (talvez já esteja deitado na savana, exibindo-se para os outros leões), Louise toma um chocolate-quente com o novo amigo e as crianças acenam para ela do pátio. A sensação é de que tudo vai ficar bem, graças ao poder transformador da amizade.
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Escrito pelo dinamarquês Kim Fupz Aakeson, A Menina e o Leão é o trabalho de estreia da ilustradora Julie Völk ~ a dupla levou os prêmios Serafina em 2014 e o Troisdorfer Picture Book Prize em 2015, na Alemanha. O traço da Julie é simplesmente encantador e confere um ar de poesia para essa história, já tão carregada de sensibilidade. Cada ilustração tem muito a dizer e detalhes infinitos. Um exemplo simpático é, quando Louise está isolada com seu leão na hora do recreio, podemos perceber uma outra criança afastada, junto ao seu dragão (ou medo) de estimação. Uma lembrança sutil, mas poderosa, de que não estamos sozinhos nas nossas dores e ansiedades.
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A Menina e o Leão, por Kim Fupz Aakeson e ilustrado por Julie Völk
32 páginas • SESI-SP Editora
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